sábado, 15 de março de 2008

Avião para onde?

"Qual é a porta, Ju?"
Sentámo-nos frente a frente, no topo de cada fila de 5 cadeiras junto da porta, com o ar cansado de quem já vem ha 5 horas em viagens e ainda tem mais 4 pela frente.
E eis que surgem os passageiros, que à medida que chegam vão ocupando as restantes cadeiras até chegar a nós.
E ao nosso lado, um casal de velhinhos frente a frente também, ele mais velho que ela, pouco, desconchavado, de boina, ela senhora de si, com lenços, vestida para ir à cidade de avião.
Coisa linda.
"Pucha-me ach pantalonach pa chima home!!!" diz ela com ar de quem parece muito mal e que está toda a gente a ver, e o velho la ajeita as calças e a braguilha, com ela a judar também pois, que pelo ar ela devia ser fresca devia.
"Bamos pá fila, home?"
E ele que não, que ainda faltava muito, que estava bem sentado, mas com aquele ar de quem eventualmente terá mesmo de ir porque a sua senhora insistia, e para aí à terceira vez ela decidida manda-se
"Olha eu bou pá fila qué pa chermos os primeiros!"
E se por momentos eu pensei "vai sozinha" ela logo me desmente e acrescenta:
"Anda!"
E o velho deixa-a ir à frente, levanta a cabeça ligeiramente sobre a esquerda, para o painel onde estava a hora em que começaria a entrada no avião, e quando suspira solta um
"Oh..."
que foi muito mas muito mais do que isso, foi daqueles que como que dizem

que se lixe, já te aturei uma vida inteira, mais meia hora menos meia hora não me faz diferença

e levantou-se e acompanhou a mulher dele.
E a Ju sorriu, e eu olhei a pista de aterragem nublada com um sorriso de quem admira aquela cena maravilhosa do amor de uma vida ao jeito de duas pessoas tão diferentes e tão admiravelmente iguais, e penso que no painel da porta 7 não era preciso estar
"Porto"
lá escrito, porque eu já sabia para onde ía aquele avião.

1 comentário:

Rosa disse...

Esse sotaque não é do Porto... ai não é não... :)