terça-feira, 11 de novembro de 2008

Ter pena e lamentar

Há uns meses atrás uma amiga dizia-me que o pior sentimento que se podia ter por alguém era ter pena dessa pessoa. Fiquei a pensar no que quis dizer, e julgo que percebi.
Ocorreu-me após esta conversa que ter pena e lamentar poderiam não ser bem a mesma coisa, ou melhor, poderiam não ser bem a mesma coisa para todas as pessoas, apesar de serem sinónimos no dicionário.
Um lamento pode ser uma queixa ou um pesar que se carrega. "Lamento que não-sei-quem tenha falecido", por exemplo. Lamentar significa ter pena, sim, mas numa posição mais distante (quanto a mim) do que o ter pena. "Tenho pena que não-sei-quem tenha falecido" parece-me mais profundo, mais compadecido, mais sofrido, ok.
Mas, muitas vezes, e noutros exemplos, mais culpado. E como?
Pena é também usado para definir um castigo ou punição: pena de prisão, por exemplo. Uma pena é aplicada a quem agiu mal, a quem cometeu um crime - ou a quem não agiu quando o devia ter feito - e é aqui que eu quero chegar.
A diferença entre ter pena e lamentar não está só no grau de compaixão para com o sofrimento alheio, mas também na consciência do que fizemos para o evitar: desta forma, uma pessoa que tenha feito, ao seu alcance, o que devia para evitar determinada situação estará (ou devia estar!) mais tranquila em relação à sua acção e lamentar - repare-se, lamentar apenas - que as coisas não tivessem corrido como esperava.
Neste sentido, lamentar é constatar um desagrado, um sentimento negativo, sem contudo nos penalizarmos ou penalizarmos a pessoa à qual dirigimos o nosso lamento; também ela não teve culpa que o seu familiar tenha falecido, usando o exemplo acima. E também sob este ponto de vista, ter pena é pejorativo, é olhar e sentir um desconforto inquieto, uma sensação de que algo mais podia ser feito para melhorar, um incómodo por ver um sofrimento evitável. Ter pena é mais mesquinho, é mais punitivo. "Tenho pena que assim seja!", "temos pena, paciência", é, em algumas situações, elevar o coitadinho e a suposta vítima a um pedestal onde ele próprio quer ser levado, imerecidamente, julgando que nada mais há a fazer que atirar a toalha ao chão.
Quem tem pena de si não percebe por que não melhora; e os outros apenas lamentam esse facto.

(Gosto de ter amigas inteligentes e sensíveis)

1 comentário:

Anónimo disse...

Lamento que nem toda a gente veja o teu blog!