terça-feira, 30 de junho de 2009

Encaixes

Eu decoro caras com toda a facilidade. Assim que vejo alguém com quem sei que já estive, matuto, matuto, e chego ao sítio onde o conheci com relativa facilidade; porém, o mesmo não acontece com o nome da pessoa.
Lembro-me de uma vez, na sala de aula, no 12º ano, quando ía chamar uma amiga que o era desde o 10º e saiu apenas: "Oh...", fica ela espantada e eu vou outra vez "Oh...", e nisto já ela se ria e eu felizmente lembrei-me "Oh Sara, desculpa, mas isto acontece-me frequentemente..."
Esquecer-se do nome de alguém ou confundi-lo com outro é muitíssimo mau. Pior quando se está a apresentar uma pessoa:
- Olha este aqui é o Serginho!
"Jorginho"
- Diz, Serginho...?
"Jorginho!"
As pessoas que nunca confundem nomes não entendem, e as que confundem ou se esquecem entendem perfeitamente, mas têm medo que quando lhes acontece estejam perante as primeiras, isto é, já me aconteceu alguém com a mesma "característica incorporada de série" ter ficado melindrado consigo mesmo por ter confundido o meu nome - e eu na boa.
O encaixe entre feitios faz-se sobretudo no tratamento destas pequenas coisas, que o povo diz, e com razão, que "não são defeito - são feitio". São características especiais e latentes, intrínsecas e imutáveis. É-me fácil entender e aceitar que me confundam o nome, porque a mim também acontece. Transposto para muitas outras particularidades do dia-a-dia, é-nos fácil juntarmo-nos, para o bem e para o mal, mas mais para o mal, com pessoas semelhantes.
Todos nós conhecemos exemplos assim: o homem ciumento que antes era tratado como homem ciumento, juntou-se à mulher ciumenta, e agora todos se referem a eles como o "casal ciumento"; o sovina e a sovina juntaram-se, agora são "os sovinas"; "juntou-se a fome com a vontade de comer", usando mais uma vez um ditado popular.
Não menosprezando os casais que assim são felizes, julgo que esta situação os faz acomodar um pouco: as almas gémeas não são mais do que isso mesmo - almas gémeas. Nelas vemo-nos como que a nós próprios, limitando à partida novas perspectivas ou capacidades de adaptação a elas - porque não precisamos.
Os casais que dão nas vistas, e que são admirados, nos quais parece que as coisas batem naturalmente certo, têm, na minha opinião, esta coisa em comum: mais do que defeitos (ou feitios na má acepção da palavra) coincidentes, têm qualidades (ou feitios na boa acepção da palavra) em comum. Essas qualidades permitem-lhes tolerar a parte má do feitio da outra parte, que muitas vezes eles não entendem por simplesmente "não serem assim". Permite-lhes aceitar que a outra parte da relação também tem direito a ter as suas "taras e manias" - como diria Marco Paulo - e conviver com elas, mesmo que muito diferentes das deles; mais: a achar-lhes piada, até.
Os casais que o são verdadeiramente não precisam de encaixar, mas sim de se completar; não precisam de ter feitios coincidentes ao pormenor, precisam sim de sentir-se bem, de conviver bem com o feitio do outro; os casais que o são verdadeiramente, ao olhar-se nos olhos, têm nas cabeças de cada um dos seus elementos um pensamento recorrente: "não sei como me aturas tu, mas ainda bem que o fazes."

5 comentários:

Rosa disse...

A frase que mais sai da minha bo9ca é "tu, que não me lembro como é que te chamas". E isto com pessoas com quem estou diariamente, há anos.
Quanto aos casais - não percebi a ligação, por isso comento como assuntos separados :) -, no amor não há regras. Haverá casais que se dão super bem porque são iguais, e outros, pelo contrário, em que a coisa só funciona porque são muito diferentes.

Anónimo disse...

Antes de mais, peço desculpa por vir assim invadir o teu espaço.

Há tempos enviaste-me uma msg para o meu hi5 a pedir a letra da Roseira da EUC.
Até hoje não tenho conseguido envia-la, resta-me tentar por aqui.

Estudantina Universitária de Coimbra - Roseira

Estava uma noite fria
Só uma estrela brilhava
Nem as minhas mãos sentia
Para tocar minha guitarra

A primeira nota soou
E eu só te queira ver
Assim que trovejou
Começou logo a chover

Pela noite dentro, até amanhacer
Fui suportando o vento, sem parar de chover
Coisa mais ingrata não pode acontecer
Fazer uma serenata e ir-me embora sem te ver
Pedi a rainha santa que me desse um sinal teu
Que ouvisses quem te canta e a tua luz acendeu

Nunca tinha reparado na beleza do teu jardim
Nem estava preparado para o conhecer assim
É linda aquela roseira que tens sob a tua janela
Passei a noite inteira molhado junto a ela

Pela noite dentro, até amanhacer
Fui suportando o vento, sem parar de chover
Coisa mais ingrata não pode acontecer
Fazer uma serenata e ir-me embora sem te ver
Pedi a rainha santa que me desse um sinal teu
Que ouvisses quem te canta e a tua luz acendeu

Cumprimentos
Sílvia Gouveia

Marcela disse...

Não é absolutamente necessário encaixar (de todo). É, como disseste, pensar "não sei como me aturas tu, mas ainda bem que o fazes" e "não sei como é que eu te aturo, mas ainda bem que sou capaz de o fazer!" ;)
Beijinho *

Carlos disse...

Ai Marcela, não concordo :P

Marcela disse...

Oh, é óbvio que o sentimento supera isso tudo, de longe! :D
Mas também dá para pensar o contrário, às vezes.